Afastamentos por transtornos mentais aumentam 67% em dez anos

Dados são do MinistĂ©rio da PrevidĂȘncia Social

Por Redação em 11/03/2025 às 16:16:14

Em 2014, quase 203 mil brasileiros foram afastados do trabalho em razão de episódios depressivos, transtornos de ansiedade, reações a estresse grave e outras questões relacionadas à saĂșde mental.

Dez anos depois, em 2024, os nĂșmeros mais que duplicaram, passando para mais de 440 mil afastamentos em razão de transtornos mentais e comportamentais, recorde da série histórica.

Dados do Ministério da PrevidĂȘncia Social mostram que, na comparação com 2023, os nĂșmeros do ano passado impressionam – o aumento foi de quase 67%.

Causas

Boa parte dos afastamentos em 2024 foi em razão de transtornos de ansiedade (141.414), seguidos por episódios depressivos (113.604) e por transtorno depressivo recorrente (52.627).

Em seguida aparecem transtorno afetivo bipolar (51.314), transtornos mentais e comportamentais decorrentes do uso de drogas e outras substâncias psicoativas (21.498) e reações ao estresse grave e transtornos de adaptação (20.873).

Também integram o rol de afastamentos por doença mental em 2024 casos de esquizofrenia (14.778), transtornos mentais e comportamentais decorrentes do uso de ĂĄlcool (11.470) e uso de cocaĂ­na (6.873) e transtornos especĂ­ficos da personalidade (5.982).

A tĂ­tulo de comparação, em 2024, os afastamentos por transtornos de ansiedade, por exemplo, aumentaram mais de 400% em relação a 2014, quando somavam 32 mil. JĂĄ os afastamentos por episódios depressivos quase dobraram em uma década.

AnĂĄlise

Para o professor de psicologia da Universidade Federal da Bahia e membro do Conselho Federal de Psicologia Antonio VirgĂ­lio Bittencourt Bastos, os nĂșmeros demonstram o que jĂĄ vinha sendo monitorado por especialistas: uma crescente crise de saĂșde mental no Brasil.

"Os indicadores de adoecimento e de sofrimento psĂ­quico extrapolam o mundo do trabalho. A crise de covid-19 nos trouxe essa pós-pandemia. Vivemos numa sociedade adoecida. Houve uma ruptura muito profunda da forma como vivĂ­amos e vivemos, em certa medida, sequelas dessa experiĂȘncia traumĂĄtica."

"Fora isso, a gente vive, na sociedade global, um contexto de mudanças muito profundas. Nos modos de interagir, na digitalização da vida, nos avanços tecnológicos que reestruturam toda a nossa dinâmica social. Esse conjunto de mudanças sociais, tecnológicas e econômicas geram um mundo muito mais inseguro e incerto", completou.

Para o psicólogo, parte da crise de saĂșde mental advém de uma conjuntura maior, de reestruturação e de dinâmica acelerada de mudanças.

"HĂĄ um processo em curso. Estamos no meio de um processo muito intenso de reestruturação da vida em sociedade e é natural, é esperado que as pessoas reajam a essas mudanças com dificuldades".

"Sem dĂșvidas, a gente tem fatores mais especĂ­ficos no contexto de trabalho", disse. "Esse impacto da revolução tecnológica, reestruturando postos de trabalho, redefinindo modelos de gestão, precarizando o trabalho e fragilizando vĂ­nculos. Isso, de alguma forma, torna a situação no trabalho especĂ­fica, em que essa crise assume proporções, tonalidades e caracterĂ­sticas próprias."

"Ao lado dessa dinâmica de transformação do mundo do trabalho e de mudanças drĂĄsticas, vocĂȘ também convive com modelos de gestão e prĂĄticas arcaicas, tradicionais. Temos uma cultura que favorece prĂĄticas mais autoritĂĄrias, que levam a maior quantidade de tensões e conflitos e relações interpessoais mais difĂ­ceis."

Qualidade de vida

Segundo Bastos, em razão de todo esse contexto, manter a qualidade de vida se tornou um dos grandes desafios desse milĂȘnio. "Como construir um mundo mais sustentĂĄvel, harmônico, um mundo em que as pessoas conseguem equilibrar vida familiar, vida pessoal. Isso tudo é um grande desafio".

Para ele, a crise na saĂșde mental chama a atenção e mostra a importância de que o próprio estado assegure apoio e suporte por meio de programas e ações especĂ­ficas, que não sejam de curto prazo.

"HĂĄ soluções paliativas. Programas que não vão na raiz do problema. VocĂȘ vĂȘ uma série de ações, projetos e programas desenvolvidos, mas que lidam com sintomas e consequĂȘncias do problema. Não vão na raiz, no modelo de gestão, nos processos de trabalho."

Bastos defende que haja mudanças profundas: "[é necessĂĄrio] mexermos em profundidade na forma como o trabalho estĂĄ organizado, na forma como as relações estão estabelecidas. Nossa preocupação é não imaginar que basta dar assistĂȘncia psicológica e o problema serĂĄ solucionado."

Fonte: AgĂȘncia Brasil

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